Todos aqueles desvios que, ocultos durante séculos pelos prelados, levaram à Reforma Protestante, a qual, ao contrário do que apregoam os católicos, não foi um movimento “cismático” (como se referem aos protestantes até hoje) que desejava “dividir” a Igreja. Entre em qualquer site católico e comprove. Lutero e reformadores como Wycliff, Huss e Calvino, dentre outros, queriam que a cristandade voltasse à pureza original, à simplicidade primitiva dos apóstolos, e abandonasse todas as práticas herdadas do paganismo através dos séculos, sobre as quais falei aqui, aqui, aqui, aqui e aqui- para ficar só nessas.
Resumindo: a hierarquia católica quando viu
que as pessoas em toda parte estavam abrindo os olhos, multidões se entregavam
a Jesus, abandonando os ídolos e suas superstições e a Bíblia estava sedo
traduzida na linguagem de cada povo – o que levaria à comparação da vida dos
discípulos com a dos padres, bispos, cardeais, “papas” e outros títulos – resolveu
se mexer.

Por volta de 1530, o fervor religioso crescia dentro
da igreja de Roma. Muitos clérigos perceberam que o ensino dos reformadores era
de fato correto: eles queriam uma vida espiritual mais profunda, mas não tinham
forças, coragem ou inteligência para abandonar as velhas tradições. Assim, reconheciam
a necessidade de um movimento que incentivasse as pessoas a buscarem a Deus;
mas tinham medo de serem queimados como hereges. Alguns desses homens foram
feitos cardeais pelo “papa” Paulo III, para elaborar uma reforma religiosa e em
1537 produziram um documento afirmando que os abusos eram culpa de “papas” anteriores.
Surgiram novas ordens religiosas (monges e freiras), e com suas regras de
pobreza, castidade e obediência cega ao “papa”, recuperaram parte do respeito
perdido durante séculos de ganância e vícios. Os abusos foram coibidos, e houve
certa moralização, que não se vê hoje em dia.

O romanismo não tinha escapatória ao ser
confrontado com a Palavra de Deus, agora largamente difundida graças à imprensa.
As cruzadas, que em tese deveriam libertar a Terra Santa do domínio árabe,
haviam falhado miseravelmente. A igreja romana canalizara a frustração da
derrota atacando os chamados hereges, que na verdade apenas rejeitavam os
abusos papais e, como os primitivos cristãos, só aceitavam a autoridade da
Bíblia. Roma, por seu lado, interpretava ao pé da letra as passagens da Bíblia
que lhe interessavam, e dizia seguir Deuteronômio 13:1-9, 17:25 e Êxodo 22:18,
que mandavam punir os feiticeiros e agoureiros. Citavam até as palavras de
Jesus no Evangelho de João 15:6: “Se alguém não
permanecer em mim, será lançado fora... e ali arderá”. Assim,
passou a perseguir a todos os que se opunham à doutrina papal, acusando-os de
servirem ao Diabo.





Mas além da violência física e psicológica, outro
expediente foi usado para tentar ocultar o Evangelho. A imprensa prestava um
serviço inestimável à Verdade. Livros, panfletos e a própria Bíblia alcançavam
grandes tiragens, e a procura era intensa. Então a igreja romana elaborou uma
censura: o “Index”, uma lista de livros que não se podia ler e nem mesmo
possuir, sob o risco de ir para a fogueira.
A primeira edição do Index saiu em 1543, e dela
constava, além de autores protestantes, filósofos humanistas como Erasmo de
Rotterdam e, pasmem os senhores, a própria Bíblia. O hoje clássico “Os
Lusíadas” de Camões, só veio a lume com a autorização do censor da Inquisição em Portugal. Mas ainda
hoje algumas edições de livros possuem, como curiosidade tipográfica, o selo
“Imprimatur” - a autorização da Inquisição para ser impresso.
Para resolver o
“problema” da Bíblia, o concílio (reunião geral de bispos) que se realizou na cidade
italiana de Trento entre 1545 e 1563 concluiu que deveria ser feita uma edição
“católica” da Bíblia. Assim foram incluídos nas Sagradas Escrituras os livros
chamados apócrifos. Conhecidos de longa data, mas desprovidos de inspiração
divina, cheios de absurdos teológicos, históricos e geográficos (para não falar
de heresias evidentes, apesar de terem certo valor literário), essas obras
pretenderam justificar os erros do romanismo, já que agora eram oficialmente
parte da Bíblia. Aos católicos só seria permitido ler essa versão, que recebeu
também longos comentários de rodapé, com a interpretação oficial de Roma.

Fundada pelo ex-soldado, mercenário e aventureiro basco
Ignácio de Loyola, a ordem veio para combater as “heresias” e promover missões
e a educação, como prevenção ao protestantismo. Ainda hoje, ela controla várias
instituições educacionais católicas, inclusive no Brasil, onde chegou nas
caravelas de Cabral. Nóbrega e Anchieta pertenciam a essa organização. É
interessante notar que algum esforço foi feito para “catequizar” (definição
católica de “evangelizar”) os indígenas, após muito discutirem se eles
tinham alma ou não. Mas pouco foi feito em relação aos escravos; aliás,
muitos padres eram donos de escravos, e nada fizeram até o século XIX para
libertá-los.
De qualquer forma, apesar dos golpes sofridos pela
Reforma Protestante, já começava a soprar o vento do Espírito, avivando os
crentes e preparando a Igreja para um novo período de vitória sobre essas
trevas.



E é por isso que você não deve se deixar iludir pela pompa e
circunstância que cerca essa “actio inter amicos” que acontece em
Roma, de tempos em tempos.
Doa a quem doer...
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