sábado, 15 de janeiro de 2011

Mais um "santo" no panteão

O anúncio foi feito pelo Vaticano: JP2, por decreto de homens iguais a ele, vira santo e pode receber culto. Bento 16 autorizou a publicação de um milagre atribuído a seu antecessor. De acordo com o testemunho de médicos ouvidos pelo Vaticano, a freira francesa Marie Simon Pierre Normand, do Instituto das Pequenas Irmãs das Maternidades Católicas, sofria de doença de Parkinson, enfermidade que JP2 também enfrentou nos últimos anos da sua vida. A freira obteve uma cura não explicada pela ciência, em junho de 2005, dois meses depois da morte do “papa” polonês. A publicação conclui o processo que precede a beatificação.
Depois do dia 1.º de maio (2011), JP2 se tornou “beato”, e aí sim pode ser venerado como intercessor e receber culto público restrito em cerimônias litúrgicas. Daí vem a canonização, quando o “beato” é promovido a “santo” e recebe culto público universal na igreja católica. O que finalmente aconteceu por obra e graça do atual chefe do Vaticano, seu Jorge Bergoglio, em 27 de abril de 2014. 
No início do seu pontificado, em 1983, JP2 reformou a lei da beatificação e canonização ao agilizar a burocracia, e a estratégia deu certo: ele sozinho beatificou 1.341 pessoas e canonizou outras 482, cifras sem precedentes.  A maioria dos novos “santos” vieram de países pobres, visando reacender a fé no catolicismo e combater seus “inimigos”: igrejas evangélicas, o comunismo e os muçulmanos. As novas regras pedem cinco anos entre a morte do candidato e o início da canonização, mas o “papa” Bento decidiu desburocratizar a coisa toda e no mesmo ano da morte de JP2 iniciou o processo. Assim o líder supremo dos católicos agora pode abrir mão da beatificação e declarar a canonização diretamente.
beatificação de JP2 é um acontecimento sem precedentes, já que nos últimos mil anos nenhum “papa” beatificou seu antecessor imediato. Mas Joseph Ratzinger fez de Karol Wojtyla um “santo”, e só não completou o serviço porque pediu o boné antes. O número total de “papas canonizados” é de 78, e outros dez foram apenas “beatificados”. Praticamente todos os bispos de Roma viraram “santos” até o século VI, mas a partir daí caiu o número de promoções a semi-divindades. Durante a Idade Média, só dois “papas” foram santificados no século XI: Leão IX (1002-1054) e Gregório VII (1020-1085), que foram promovidos imediatamente após abotoar a batina de madeira. E do século XIII, só Celestino V, que era um monge eremita, mas foi eleito “papa”, renunciou meses depois e foi proclamado “santo” em 1313, 20 anos depois de morto. No entanto, isso foi idéia de seu terceiro sucessor.
Pio V foi o único renascentista “canonizado”: foi ele quem excomungou a rainha Elizabeth I da Inglaterra. Depois disso, só galgaram os píncaros da glória Pio IX (que em 1854 proclamou os dogmas da imaculada conceição de Maria, em 1854, e da infalibilidade “papal” em 1870), Pio X e João XXIII, esses dois últimos por JP2 em setembro de 2000. Atualmente tramitam os processos de beatificação de Pio XII (1939-1958, aquele que colaborou com os nazi-fascistas em Roma e fez que não viu o massacre no bairro judeu durante a II Guerra) e Paulo VI (1963-1978). Com se vê, todos prestaram grandes serviços à causa católica, de criar dogmas e excomungar protestantes a perseguir judeus. Merecem mesmo homenagem de seus pares.
Há várias perguntas que precisam ser feitas – e respondidas. Desde quando alguém pode decidir se fulano ou cicrano é “santo”, no sentido católico romano, isto é, “canonizado”? A Bíblia, que os católicos dizem seguir e obedecer, afirma que “santo” é todo aquele que passa pelo processo da conversão, isto é, a pessoa recebe Jesus como salvador pessoal e Senhor, e a partir daí começa a ser edificado, caminhar a cada dia e crescer no conhecimento da Palavra e da vida cristã. Abandona o pecado e se torna cada dia mais parecido com seu Senhor. Isto é o processo de santificação.  E para isso não precisa ser eleito por um bando de cardeais. Aliás, esse bando é composto do tipo de pessoa que não tem moral para “santificar” ninguém, conforme mostro melhor aqui e aqui.
Segunda, o “santo” católico é uma espécie de secretário ou auxiliar de Deus, que por ser muito ocupado, delega alguns milagres a seus assistentes, os santos – católicos, lógico. Embora não se possa dizer que Deus é católico não se tem notícia de nenhum santo de outra religião; e embora o Dalai Lama se auto-intitule “Santidade” dificilmente entrará para o panteão romano. Ou então, Deus, por estar muito distante, por ser mais santo que todos os santos, não pode nem passar perto de pecadores quanto mais atendê-los, e então os “santos” se encarregam do trabalho. Aliás, esta é a mesma idéia por trás do mote “peça à mãe que o filho atende”: Jesus estaria num patamar tão elevado, mas tão elevado, que não pode atender aos pedidos dos mortais, mas Maria, essa sim, bondosa e prestativa, “ouve as orações” e intercede junto a Jesus – aí sim, Ele atende, mas só por que mamãe pediu.
Esquecem-se de que nem Maria nem qualquer outro personagem, bíblico como Pedro, lendário como Seu Jorge, o do dragão, ou contemporâneo como JP2 e Madre Teresa, tem a prerrogativa de ser “intercessor”: esse papel cabe somente ao Espírito Santo, conforme a Bíblia ensina (“Do mesmo modo também o Espírito nos ajuda na fraqueza; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o Espírito mesmo intercede por nós com gemidos inexprimíveis. E aquele que esquadrinha os corações sabe qual é a intenção do Espírito: que ele, segundo a vontade de Deus, intercede pelos santos, Romanos 8:26,27.). E ninguém pode se arvorar “mediador”, pois a Palavra de Deus diz que “...e a Jesus, o mediador de um novo pacto, e ao sangue da aspersão, que fala melhor do que o de Abel”,  Hebreus 12:24, e “há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual se deu a si mesmo em resgate por todos, para servir de testemunho a seu tempo”, I Timóteo 2: 5,6.
Terceiro, todos esses “santos”, doa a quem doer, acabam virando mais combustível para a famigerada “fé popular”, que mistura alguns poucos elementos genuinamente bíblicos (Deus, Jesus, o céu, o destino eterno das almas) com outros oriundos do paganismo (velas, relíquias, missas, oração pelos mortos, jejuns, penitências, dias sagrados, procissões, peregrinações, e a própria crença em “santos” ou mediadores). Nessa mixórdia toda, as imagens de escultura ocupam lugar de destaque, e não há como evitar a pecha de idolatria. Nem mesmo os maiores doutores da lei canônica conseguem dar uma explicação convincente para a diferença entre “hiperdulia” (apenas homenagem, ainda que exagerada, ao finado) e “idolatria” (é isso mesmo, adoração ao ídolo).
Ou alguém ainda vai dizer que pedir milagre para a estátua do “papa” não está contra um dos dez mandamentos: “Não farás para ti imagem esculpida, nem figura alguma do que há em cima no céu, nem em baixo na terra, nem nas águas debaixo da terra.Não te encurvarás diante delas, nem as servirás; porque eu, o Senhor teu Deus, sou Deus zeloso, que visito a iniqüidade dos pais nos filhos até a terceira e quarta geração daqueles que me odeiam”, Êxodo 20:4 e 5?
Posso ficar aqui um tempão expondo os erros desse pessoal, mas... como este é um país democrático, cada um escolhe onde vai passar a eternidade, se ao lado do Verdadeiro Mediador ou ao lado dos “papas”.
Enquanto isso, leia mais sobre a bênção dada pelos “papas” aqui.

Doa a quem doer.

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Atualizado em 04 de maio de 2014