Virou moda, não apenas na mídia e nas redes sociais como também
dentro da Igreja Cristã reclamar e bradar aos quatro ventos contra a corrupção, real ou imaginária, propagada nos grupos de Whatsapp em fake news intermináveis. Que ficam pululando já por mais de dez anos: de vez em quando elas voltam.. Sermões e


Antes
de tudo, é preciso esclarecer qual era o papel dos profetas
nos tempos bíblicos, e também dentro da Igreja e sua relevância para o mundo.
Houve
um tempo em que o governo de Deus se manifestava em duas
esferas, a civil e a religiosa, em um reino monárquico – mas de cunho
teocrático, onde as leis divinas também serviam como lei civil. É por isso que
algumas vezes as admoestações dos profetas do Velho Testamento extrapolavam a
esfera religiosa e faziam menções a situações de crise social ou econômica (ver
Amós 2:6-8; 3:10; 4:1 etc.).
No
Antigo Testamento alguns profetas sofreram perseguições por trazer a
mensagem divina. O ofício do profeta era de âmbito nacional. Quando Deus
levantava um profeta, conferia-lhe a missão de falar em Seu Nome para toda a nação
e até para povos estranhos (como Jonas).
Deus
permitiu, naquele momento histórico peculiar, que os profetas
abordassem, de vez em quando, assuntos alheios à religião, até mesmo para que
as profecias de cunho não-religioso, que se cumpririam em curto prazo, pudessem
servir de prova para as profecias de cunho religioso (que são mais importantes
por envolver a salvação do gênero humano) – as quais deviam se cumprir muito
depois, especialmente no que diz respeito ao Messias. Desta forma, a destruição
do Templo, a dispersão dos judeus, a conversão dos pagãos e outras profecias que
se cumpriram relativamente em curto prazo serviram como uma prova certa de que
também as profecias ainda não-cumpridas também se cumpririam – e se cumprirão a
seu tempo (como a vinda do Messias, Sua crucifcação, o Anticristo, a
ressurreição dos mortos etc.). Esse tipo de profecia de “curto alcance” pode
ser visto em Isaías caps. 36 e 37.

Depois
do exílio babilônico, quando do restabelecimento de Israel,
a difícil situação socio-econômica gerou um ambiente de crise social, cujas
injustiças foram denunciadas inicialmente por Amós, indo até a época de Malaquias,
cronologicamente, cerca de 400 a.C. Esse período, diferentemente do anterior, foi
caracterizado pelo sofrimento e marginalização dos profetas. De homens dignos
de reverência passaram a ser vistos com hostilidade, porque sua mensagem ia de
encontro aos interesses escusos das lideranças religiosas e políticas (Hebreus
11:36-38).
O
plano de Deus era que houvesse
cooperação entre profetas e sacerdotes, mas estes últimos tendiam a aderir ao
liberalismo e deixavam de protestar contra a decadência. O livro de Malaquias é
uma dura advertência dos profetas contra os sacerdotes, os verdadeiros ladrões
do dízimo (e não o povo, como se tenta fazer crer hoje em dia). Leia mais sobre
isto aqui.
Os sacerdotes muitas vezes concordavam com a situação reinante, e sua adoração
a Deus resumia-se a cerimônias e liturgias. O profeta, por outro lado,
ressaltava o modo de vida, a conduta e as questões morais. Repreendia
constantemente os que apenas cumpriam com os deveres litúrgicos. Irritava,
importunava, denunciava, e sem apoio humano defendia justas exigências e
insistia em aplicar à vida os eternos princípios de Deus. Era ensinador da
ética, reformador moral e inquietador da consciência humana. Desmascarava o
pecado e a apostasia, procurando despertar a um viver realmente santo.
Quando chegamos no Novo Testamento, há uma transição no ministério do profeta.
Vemos João Batista, tido por muitos como o último profeta do Antigo Testamento,
pelo caráter de sua pregação – denunciou as mazelas dos líderes religiosos e
políticos da nação, como antes dele Ageu, Malaquias e principalmente Elias, mas
também anunciou o Messias, como Isaías. E quando a Igreja é instituída, o ministério
dos profetas se revela um dom de Deus para a edificação do Corpo de Cristo.
No Novo Testamento os profetas não perderam a preeminência. Mas, diferentemente
de antes, não mais atuam ungindo reis. Não mais participam do governo, mas juntamente
com os apóstolos e outros ministérios, são as colunas da Igreja. Seu ministério
é muito mais em âmbito interno, porque tudo que se precisa saber acerca das
nações e do governo humano já está revelado. Leia, por favor, o Salmo 2 e
Apocalipse 11:10, 17-18; também o cap. 17:12-16. O governo humano, as nações,
suas instituições, sua política, sua economia, suas leis, tudo jaz (i.e., descansa,
se apóia) no Maligno (I João 5:19), e por isso não há outro caminho senão a
destruição.
I Coríntios 12: 27 -29 e Efésios 4.11-13
atestam o caráter de edificação da Igreja que acompanha o ministério dos
profetas nesta era. O Senhor continua a levantar e a usar seus
porta-vozes para revelar a sua mensagem ao seu povo. Podem eventualmente
aconselhar governos, pessoas influentes, admoestar e até mesmo criticar, tendo
como padrão a Palavra de Deus, mas não podem se deixar levar por suas próprias
preferências pessoais. E este, penso, é um dos maiores erros da Igreja de
nossos dias.

Essa doutrina, embora eminentemente católica na sua origem,
tem desdobramentos na igreja evangélica, uma vez que muitos pastores crêem nela
com todas as suas forças. Daí essa idéia se desdobrar pelas igrejas, e a partir
de certo momento, muitos passaram a se arvorar em arautos de Deus e tentar
influenciar - em suas próprias palavras - governos e governantes, e conquistar
cidades e nações “para Deus”.
Quando não conseguem, põem-se a criticar o
governo e os governantes que não lhes agradam, dizendo-se “profetas de Deus”,
quando no fundo são apenas profetas de si mesmos.
Muitos pastores e líderes são sinceros, e imbuídos de um
forte senso de mora, ética e honestidade, querem de fato que a nação seja um
exemplo para todo o resto do mundo. Como qualquer cidadão de bem, ficam triste
quando vê notícias sobre corrupção e dilapidação do patrimônio nacional. Mas,
como qualquer cidadão, estão sujeitos ao momento histórico e ao contexto
social, político e cultural em que foram formados, o que, na maioria das vezes,
significa serem conservadores, ideologicamente à direita no espectro político,
avessos ao socialismo – mesmo que às vezes nem saibam direito o que é. Veja
bem, não estou dizendo que é certo ou errado estar à direita, ao centro ou à
esquerda, ou em qualquer outra divisão que se queira adota – o que quero dizer
é que os cristãos – líderes, leigos, com cargo ou sem cargo – devem primeiro se
questionar se estão contra ou a favor do governo atual por questões ligadas à
ética, honestidade, transparência, querer o melhor para a nação etc., ou se são
contra ou a favor apenas porque gostam ou não gostam de quem está no poder, no
momento.


Mas às vezes a coisa se inverte totalmente de lado. Dependendo do governo do momento, não só podemos, mas devemos nos revoltar contra a injustiça e a
corrupção, como se fosse coisa nova. Se o governo é do agrado do conservador, então relativiza-se Romanos 13:1 e 2, e entra em cena Provérbios 29:2 (“Quando os justos se engrandecem, o povo se
alegra, mas quando o ímpio domina, o povo geme”), que aliás, foi
usado para pedir votos para Marina Silva. Como a dizer que, se o governo for
exercido por cristãos, tudo será só maravilhas, oh glória. Esquecendo-se de que
o país já foi governado por pelo menos dois evangélicos, Café Filho (1954) e
Ernesto Geisel (1974-79), e não se tem registro de que a situação tenha sido de
alívio para todo mundo. Aliás, o período de Geisel foi onde mais recrudesceram
as prisões, torturas e mortes do regime verde-oliva. Então, confesso que não
sei até que ponto o estímulo a “ir pra rua”, partindo dos púlpitos modernos,
realmente tem a ver com o desejo de justiça, ética, transparência, fim da
corrupção, ou até onde é meramente um discurso de classe, político-partidário,
ideológico, de um segmento que simplesmente apoia determinado político.
Mais uma vez – isto é um direito do cidadão, o de se
posicionar contra, a favor ou com neutralidade ou até mesmo indiferença diante
de situações específicas. Agora, querer assumir o papel de profeta, de Elias e
de João Batista, como se fosse um paladino da justiça, apenas para esconder
preferências pessoais, partidárias, classistas e de caráter ideológico e
político, e pedir intervenção militar, volta da ditadura, fechamento do Congresso e da Suprema Corte, não posso aceitar de jeito nenhum. É dominionismo, em maior ou menor
grau – simplesmente desejo de poder, de querer “governar em nome de Deus”, o
que já discuti antes em vários posts anteriores,
doa a quem doer. Vá aqui mesmo em “pesquisar neste blog” que você acha.
Se isso fosse um desejo genuíno de justiça social,
probidade, ética, tudo de bom... esses líderes teriam se manifestado antes.
Bem antes.
No
tempo dos generais, por exemplo.
Ou no
tempo dos anões do orçamento.
Não
teriam defendido Collor ou um genocida, misógino, racista, admirador de torturadores.
E por
aí vai.
Com
informações adicionais de:
http://www.apazdosenhor.org.br/profhenrique/licao7-dem-2tr14-o-ministerio-de-profeta.htm604,030