Li outro dia sobre um evento que pode provocar uma reflexão. A
juventude evangélica de Porto Velho participou do “1º Gospel Show”, uma mistura de
música religiosa com hip-hop – incluindo grupos de danças
coreografadas e grupo de pagode gospel.
Há alguns anos, isso seria impensável, pois a música evangélica era solenemente
sacra e sem os embalos rítmicos que os conservadores costumavam tachar como “da
carne” ou profanos, por incentivar o corpo ao balanço e ao requebrado. Mas atualmente, pagode, funk, rock, forró e até o hip-hop ganham versões gospel com letras que
tentam pregar o evangelho.
O teólogo Messias
Alves (graduado pela UNACH – Universidade Adventista do Chile) diz que,
principalmente no final dos anos 1980, começou se fazer uma mistura de ritmos
com o propósito de evangelizar: “A
princípio, a inserção de certos ritmos no campo da música gospel ou evangélica
se deu sob muita resistência. Até hoje muitos evangélicos não aceitam os
chamados Pagode Gospel, Rock Gospel e outros, por considerarem uma ‘mistura do
santo e do profano’. No entanto, mesmo os mais conservadores podem constatar
que tal revolução na música evangélica resultou numa maior aproximação dos
jovens ao Evangelho e, conseqüentemente, em mudança de vidas”. Eu,
particularmente, tenho minhas dúvidas. É fácil constatar que nos últimos vinte
anos houve melhora no nível técnico, mas em relação ao conteúdo isso é bastante
discutível.Será? D. M. Lloyd-Jones, um dos grandes teólogos do século XX, explica o que significa o louvor, a adoração e a ação de graças, que são o padrão para a Igreja Cristã. Por que devemos cantar? O que devemos cantar? Como devemos cantar? O canto sempre foi importante para o povo de Deus. Baseado em Efésios 5:18-20, Lloyd-Jones trata da maneira como os crentes devem expressar suas vidas cheias do Espírito na igreja e em seu viver diário. Ele define salmos, hinos e cânticos espirituais e dá atenção referente ao cântico de salmos, discute o lugar da melodia no culto e nos faz lembrar que o cristão, sempre, e em todas as áreas da vida, deve cantar ao Senhor, pois Ele é bom e a Sua misericórdia dura para sempre.
C. H. Fischer escreve que, “da mesma forma que no mundo secular há várias sub-culturas (...) existe uma nova sub-cultura, a aberrante Cultura da Música Cristã. Ela se desenvolveu imitando o padrão satânico da indústria de entretenimento secular, ao qual ela busca igualar-se. A música secular e a indústria de entretenimento também têm sub-culturas que seguem as regras da sociedade, e parece que grande parte da cultura da Música Cristã Contemporânea (MCC) desenvolveu a mesma tendência. Este fato é sem precedentes nos tempos modernos, uma vez que a música sempre foi vista como um braço da Igreja, sob sua autoridade e direção. Hoje, porém, ela se desenvolveu numa cultura autônoma de pessoas, as quais resistem audaciosamente a qualquer tentativa da liderança da Igreja de questionar seu estilo de vida ou monitorar seus métodos e estilos. Embora os níveis de liderança ainda estejam sob a proteção da regulação e aprovação da Igreja, a aberrante Cultura da Música Cristã é comandada por pessoas seculares, operando num formato frouxo, liberal, onde o pecado e o erro são aceitos, desde que um rótulo de ‘cristão’ seja afixado frouxamente sobre ela”. Leia mais aqui.
Há 150 anos Spurgeon já dizia: “O diabo raramente criou algo mais perspicaz do que sugerir à igreja que sua missão é prover entretenimento para as pessoas, tendo em vista ganhá-las para Cristo. A igreja abandonou a pregação ousada, como a dos puritanos; em seguida, ela gradualmente amenizou seu testemunho; depois, passou a aceitar e justificar as frivolidades que estavam em voga no mundo, e no passo seguinte, começou a tolerá-las em suas fronteiras; agora, a igreja as adotou sob o pretexto de ganhar as multidões”. Seu sermão “Alimentando as Ovelhas ou Divertindo os Bodes?” pode ler lido aqui.
Voltando
especificamente à questão musical, hoje em dia esquece-se que para ser chamada de música
a composição precisa necessariamente ter melodia, ritmo e harmonia. Verificamos
que a maioria dessas “canções modernas” não atende a esse requisito básico. O hip-hop e o rap,
por exemplo, possuem apenas ritmo (aliás, rap é uma sigla para “rythm and poetry”, ritmo e
poesia – ou letra, em inglês). Isso quando tem letra. Veja essa pérola do
“músico gospel” Adriano
Gospel Funk:
“Pras irmã e pros irmão, que curte o som pancadão
Eu mando assim ó: Vem pro gospel funk
Pra se divertir com
Jesus no coração
Você vai ser feliz então,
vem pro gospel funk (2x)
A juventude, os adultos, os
coroa e as crianças,
então pula e agora dança (2x)
A juventude, os adultos, os
coroa e as crianças, (2x)
Vem pro gospel funk pra
se divertir...”
Ô Adriano,
tá me ouvindo? Sem comentários
essa sua “letra” hein...
Quando há
algo além do ritmo, vemos que muitas harmonias são defeituosas, pois são em
tons menores ou usam dissonâncias, mensagem subliminar que destoa da letra dita
“cristã”. Como pode uma mensagem cristã ser distorcida ou dissonante?
Psicologicamente estabelece-se um conflito na mente de quem ouve.
E a letra?
Aí é está o pior, se é que algo pode ser ruim, péssimo ou pior. Poucas letras
sobrevivem a um exame bíblico, isso quando não trazem ensinos bíblicos pela
metade e até heresias. Por exemplo, “quero ser como Zaqueu” parece bacana. Mas
quem quer distribuir seus bens aos pobres? Leia Lucas 19:8.
“És Deus de
perto, e não de longe”. Mas a Bíblia
diz que Ele é Deus de perto e de longe também. Jeremias 23:23.
“Derrama a
tua shekinah sobre nós”. Se perguntarmos o que significa esta palavra,
todos dirão: “a glória de Deus”. Mas a palavra “shekinah” não é encontrada em nenhum lugar das Escrituras!
E “glória” no hebraico é “kavod” (o peso da glória de Deus). “Shekinah” vem da raiz “shakhan” que significa: habitar, fazer morada. Esta idéia
de “skekinah”=glória
aparece somente na literatura rabínica: os judeus cabalistas é que começaram a
usá-la a partir do séc XIII.
Há muitas
outras pérolas, tão
distantes do padrão bíblico como o Oriente do Ocidente. Muita gente há de
discordar; tudo bem, o país é democrático.
Tem música que é para adoração e louvor, e tem música que é
apenas entretenimento. Se essa distinção fosse levada a sério, haveria uma
seleção do que cantar na igreja e do que colocar no carro, do que ouvir
enquanto se faz caminhada, em festas, acampamentos, nas raves gospel que algumas igrejas promovem, shows, funk evangélicos, pagodes etc. Por que no
dia em que se entender que isso é apenas meio de vida, uma forma de expressão
“até-certo-ponto-mais-ou-menos-quase” artística, um produto à venda no mercado
e que portanto nada tem a ver com Deus e Seu Reino, acaba a confusão se isso é
de Deus ou não, se é mundano ou não, se aquilo outro é do homem ou do Diabo (http://bit.ly/9NcLnK).
E a gente para de ver micos como este e este...
E antes que se conteste dizendo que muitos grupos de rock gospel promovem transformação de vidas, digo
que concordo em
parte. Bandas como
Stryper e Petra, que no início escandalizaram os santarrões de plantão, fizeram
mais pelo Evangelho do que os fariseus que os malharam. Mas as letras dessas
bandas são Bíblia pura! E em suas vidas pessoais tem bem menos badalação e
estrelismo que são a tônica nos atuais pop-stars
gospel. E também eles sabiam a diferença entre show e igreja. Um dos trabalhos mais
inspirados do Petra é justamente o CD “Em Adoração” (que tem uma versão em
espanhol, “En Alabanza”) com músicas que se podem cantar tranquilamente na
igreja. Ou músicas de bandas como Third Day. Essa é a diferença.
E então leio a espantosa notícia de que um
tal Luiz Arcanjo (foto da figuraça aqui ao lado), vocalista da banda
“Trazendo a Arca” – incríveis esses nomes tirados do Velho Testamento! – lança
seu CD solo, no qual “investiu trazendo os melhores músicos do meio secular”! Leia
aqui. Ou seja, institucionalizou-se o jugo desigual (ou talvez não seja tão
desigual assim). Depois que o Diante
do Trono se associou à Rede Globo, tudo é possível. Até juntar “levita” com
“baalita” para oferecer adoração ao Senhor. A menos que não seja “para o
Senhor”; aí, tudo bem.
Tomara que
eu esteja enganado, mas pessoas
como esse Rosan Neves, de Porto Velho, que já teve casa de show como ele mesmo afirma, apenas mudaram
seu público alvo. E como ele, um monte de “artistas” gospel que pululam por aí. Doa a quem
doer.
Nota: esta matéria foi publicada originalmente em 27/02/2010. Republiquei agora porque houve um problema e ela perdeu toda a formatação.
598.520
Nota: esta matéria foi publicada originalmente em 27/02/2010. Republiquei agora porque houve um problema e ela perdeu toda a formatação.
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