segunda-feira, 17 de maio de 2010

O que o Novo Testamento diz sobre

Agora temos que ir adiante. Primeiro, falamos do aniversário de Brasília e do clima espiritual pesado dessa cidade. O que nos levou, consequentemente, a discutir a questão dos espíritos territoriais e o mapeamento. E agora, faz-se necessário debater o tema de forma mais ampla, pois praticamente todos os evangélicos, atualmente, falam sobre batalha espiritual, quebra de maldições (“hereditárias” ou não), libertação, espíritos territoriais, mapeamento, e outros temas relacionados.
Em muitas igrejas – inclusive católicas – o exorcismo passou a ser um espetáculo à parte, tendo até mesmo um dia da semana especialmente reservado para si. Elementos de cultos afro incorporados – epa! – à liturgia evangélica, como dirigentes vestidos de branco, água abençoada, sal, rosas etc. Tudo conseqüência de excessos e incompreensões acerca da batalha que, de fato, se trava continuamente nas regiões celestiais. Mas existe muito exagero em certas denominações, nos exorcismos, nas entrevistas com demônios e no poder maligno. O blog “Nani e a Teologia” aborda esse assunto, citando Wayne Grudem e sua “Teologia Sistemática”, destacando os erros das igrejas modernas sobre batalha espiritual (1).
O modelo correto - No Novo Testamento, percebemos que quanto à atividade demoníaca na vida dos cristãos, ou aos métodos de resistir e fazer frente a essa atividade, a ênfase está em exortar ao não pecar, levando uma vida de justiça.
Por exemplo, em 1 Coríntios, diante do problema das "divisões", Paulo não diz à igreja que repreenda o espírito de divisão, mas aconselha simplesmente a falar a "mesma coisa" e a mostrar-se unidos (1 Coríntios 1:10). Diante da desordem na Ceia do Senhor, não se ordena que expulsem o espírito da desordem, glutonaria ou egoísmo, mas simplesmente que esperem "uns pelos outros" e que "examine-se, pois, o homem a si mesmo " (1 Coríntios 11:33, 28).
Podemos encontrar exemplos semelhantes em muitas outras passagens das epístolas. Com respeito à pregação, o modelo do Novo Testamento é sempre o mesmo: embora Jesus ou Paulo expulsassem demônios, não é esse o modelo comum de ministério que se apresenta, pois a ênfase é na pregação do Evangelho (Mateus 9:35; Romanos 1:18-19; 1 Coríntios 1:17-2:5).
Em contraste com a prática da "batalha espiritual estratégica", não se vê no Novo Testamento ninguém que:
(1) convoque ou esconjure "um espírito territorial" ao entrar numa região para pregar o Evangelho;
(2) exija de demônios informações sobre a hierarquia demoníaca local;
(3) diga que devemos crer ou transmitir informações oriundas de demônios;
(4) ensine que as "fortalezas demoníacas" de uma cidade precisam ser derrubadas para que se proclame o Evangelho com eficácia. Antes, os cristãos simplesmente pregam o Evangelho, com o poder de transformar vidas!
Entrevista com o vampiro? Quando Jesus perguntou ao espírito em Gadara qual era seu nome, era apenas para mostrar ao povo que muitos demônios poderiam possuir uma pessoa, como Ele ilustra na parábola da casa vazia. Hoje em dia, já sabemos dessa realidade e não é preciso que o demônio informe qual é o seu nome, de onde veio ou para onde vai, o que veio fazer (basta ler João 10:10!), etc. Até porque ele é mentiroso, e não há porque acreditarmos que tal entidade se chame A ou B. Tem muita gente hoje confiando em informação de ex-bruxos, ex-satanistas etc., que obtiveram tais e tais informações quando estavam ainda sob o poder e influência de Satanás. E dessas informações não precisamos: o que a Bíblia nos ensina é suficiente.
Uma leitura do livro de Atos tem muito a nos ensinar. Quando, por exemplo, Paulo se defrontou com uma jovem possuída por um espírito, não bateu papo com o capeta, mas expulsou-o imediatamente (Atos 16:18). Quando Paulo e Silas foram em cana por pregar o Evangelho, não levaram o fato com “retaliação” do inimigo, mas responderam com cânticos e louvor. Em Corinto, cidade famosa desde a antiguidade pela licenciosidade que escandalizava até os romanos, nenhum apóstolo amarrou “espírito de pornografia” ou de prostituição que supostamente poderia dominar aquele território. Quando chegou a Atenas, Paulo de fato revoltou-se em seu espírito por ver a cidade entregue aos ídolos, mas não rodeou a acrópole nem fez ato profético declarando a libertação do lugar, muito menos ungiu ruas e prédios. Em Éfeso, não se tem notícia dos apóstolos fazendo mapeamento para saber onde estavam as fortalezas satânicas, mas a pregação do Evangelho fez diminuir tanto a idolatria e o comércio dela advindo, que os fabricantes de imagens se revoltaram. Os mágicos se converteram e queimaram seus livros. Em todas essas passagens, a arma era a pregação do Evangelho, e os resultados sempre foram a conversão e a libertação, sem mais estratégias e invenções humanas.
As armas da nossa milícia e a armadura de Efésios - Esses são termos marciais que excitam a imaginação dos mais afoitos. É como o menino que acha bacana o desfile militar, e diz que quando crescer quer ser soldado, inspirado pelas fardas reluzentes, espadas polidas e medalhas faiscantes vistas na parada.
Mas em II Coríntios 10, Paulo diz que as armas da nossa milícia não são carnais, mas poderosas em Deus para destruir fortalezas. Que fortalezas são essas? Entendo que no contexto geral da carta, o apóstolo está dizendo que não devemos nos fiar na força do raciocínio, da filosofia e da inteligência humanas, mas na Palavra de Deus, que muitas vezes vai de encontro à ciência dos homens. Lembremo-nos de que a Grécia é a pátria da filosofia e do conhecimento, e que Paulo já havia escrito antes aos mesmos coríntios sobre esse assunto (ver 1 Coríntios cap. 1 e 2). Por isso devemos levar “cativo todo pensamento à obediência a Cristo” (2 Co 10:5). Esse é o contexto das armas da nossa milícia.
Quanto à armadura, muitos pensam na armadura medieval, aquela dos cruzados ou do Rei Artur. Uma cobertura completa de metal pesado, uma espadona poderosa, talvez uma lança, machado, etc. Armas para meter medo em qualquer um.
Mas a armadura a que Paulo se refere não é desse tipo. Quase tudo neste texto é para defesa, não ataque. Muito provavelmente Paulo teve essa revelação ao observar o soldado que o acompanhava na prisão, um soldado que está de guarda! Ele não tem arma de ataque! É diferente dos soldados de uma falange grega, que usavam longas lanças, espetando os inimigos lá na frente. A armadura romana capacita o soldado a resistir ao ataque do inimigo! Para o ataque os romanos tinham outras táticas: cavalaria, catapultas, a formação da falange, o revezamento, o lançamento do pilo (uma lança curta e pesada), etc. O soldado romano não tem arma de longo alcance, como arco e flecha, lanças e dardos – pelo contrário, quem usa dardo é o inimigo, por isso devemos usar capacete e escudo. Em Efésios não se fala de pedras ou estilingues, nem de projéteis inflamados, como no filme “Gladiador”.
A única arma relacionada ao ataque em Efésios 6 poderia ser a espada. Mas a espada romana é curta, pouco mais que um punhal ou adaga, apropriada para o combate a curta distância; na prática, é quase uma arma de defesa pessoal. É uma arma para se usar apenas quando o inimigo chega perto o bastante para ser atingido. No mais, todo o resto é para a defesa e proteção: capacete, escudo, couraça, o calçado. O motivo? A guerra já está ganha, o território já está conquistado: o cristão deve guardar o que já domina, para não ser surpreendido. Por isso deve ficar firme e resistir! Essa é a mensagem de Efésios!
Conclusão - Aprendemos, portanto, que o ensinamento apostólico nesse contexto é “ficar firme”. Imediatamente antes de descrever a armadura que devemos usar, Paulo diz: “Finalmente, fortalecei-vos”. A armadura é o ponto final da carta, que começa falando sobre a soberania de Cristo (cap. 1), a salvação que Ele nos provê pela graça e o acesso que agora temos ao Pai (cap. 2). Depois, no cap. 3, aprendemos sobre o mistério de Cristo, que é a Igreja, cujo funcionamento é explicado no cap. 4, com base no comportamento individual detalhado nos cap. 4, 5 e início do 6. Aí sim, depois de tudo isso, devemos ficar firmes nesse entendimento e, para guardar o que recebemos, usamos a armadura, onde o capacete protege nossa mente, o escudo detona os dardos do inimigo e assim por diante.
A estratégia do cristão é ficar firme. É permanecer no ensino dos apóstolos. É resistir ao diabo, depois de se humilhar perante Deus, conf. Tiago 4:7. Para isso é que serve a armadura. Não para sair por aí atacando o inimigo nas suas fortalezas.
Vai ter mais.

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