Imagine – apenas imagine, por uns instantes – que você
vive nos tempos do imperador Constantino, em algum lugar do Império Romano, lá
pelo ano 330 depois de Cristo.
Feche os olhos e tente imaginar.
Como boa parte da população dessa época, você agora
professa a religião cristã. Como muitos, você antes acreditava nos deuses
antigos e ídolos de pedra e barro. Em algum momento, você ouviu a mensagem do
evangelho, pregada por algum cristão, e creu naquela palavra, porque ela vinha
carregada de esperança; era uma mensagem que lhe prometia uma vida nova, um
novo relacionamento com um Deus vivo, amoroso e misericordioso. Você teria
ouvido da vida de Cristo, que vivera três séculos atrás, que nasceu na pobreza,
andou em humildade e simplicidade. Ele pregava a inclusão de todas as pessoas
no Reino de Deus, mediante somente a fé. Havia lugar para todos. Um homem
diferente, que morrera pelos que chamava “minhas ovelhas”, “esses pequeninos”,
a quem prometera alívio do fardo pesado do pecado e uma vida plena de paz, sob
os cuidados de um Deus que olhava por todos. Um homem que em nenhum momento se
vendeu aos poderosos, que não fez nenhum tipo de acordo para ser o maioral ou
líder da nação. Um homem que venceu o ódio, mesmo sofrendo a violência. Um
homem que pregava o perdão e o amor ao próximo.
Você acreditou nessa mensagem e quis
entrar para a família de Deus. Você entendeu que vivia no pecado e só Jesus
poderia salvar de um destino terrível, nas trevas. Agora você vive na luz, e
serve a Deus, segue a Cristo com alegria e participa da vida da Igreja. Você
agora procura obedecer aos mandamentos de Cristo, de amar o próximo e fazer o
bem, porque Ele deu o exemplo.
Você sentiu apreensão e até medo tempos atrás,
porque quem queria ser cristão de verdade sofria perseguições, gozações, não
tinha oportunidade de trabalho. Sofria com estigmas e falsas acusações de
querer ser santo, querer ser diferente, de só falar de Deus, de só cantar
músicas da igreja. Cristãos não, são muito chatos.
Mas agora está diferente.
O imperador confessou ser cristão! Correram as
notícias de que ele até foi batizado! Ele ajuda as igrejas! Deve ter sido coisa
de Deus! Deus finalmente ouviu nossas orações e colocou dirigentes cristãos na
chefia da nação! Oh glória! Aleluia!

E a igreja agora tem o imperador a seu lado!
Até que você resolve olhar mais de perto.

Você agora sabe que o mandatário teve várias
esposas. Isso vai de encontro ao que os pregadores ensinavam. Você também se
surpreende ao ver que ele demonstra professar outras religiões, em várias
ocasiões. Apesar de ter sido batizado na religião cristã...
Os filhos do imperador demonstram ser pessoas
terríveis, que brigam com todo mundo e entre si. Você se pergunta o que
acontecerá nos próximos tempos se o imperador falecer.
Você olha ao redor e vê que continua a
carestia. Alimentos continuam caros, nada melhorou. Não há trabalho. A maioria
das pessoas ainda é escrava. A violência continua, roubos, assaltos,
assassinatos, muitas vezes cometidos por aqueles que deveriam dar segurança e
paz para todos. Nesse aspecto parece que Deus não está assim tão a favor deste
reino.
Mas aí você descobre que mesmo fazendo parte
da família de Deus, da igreja cristã, você não pode tocar nesses assuntos. Você
deve se calar e aceitar tudo que mandam, porque agora igreja e estado se
confundem em uma entidade só. Você achava que ter um imperador cristão iria
libertar a igreja de muitos males, mas vê que quando a igreja faz parte do
poder secular, ela se torna tão ou mais opressora do que os imperadores não-cristãos
jamais foram. Esta igreja apoia até mesmo que os inimigos do estado – reais ou
imaginários – sejam caçados, torturados e varridos da face da terra. Esta
igreja ignora os ensinos de Cristo.

Você se sente só, porque não tem mais para onde ir.
Aí você para de imaginar, abre os olhos, e vê que
você não vive mais no império romano sob Constantino, por volta do ano 330
depois de Cristo.
Ainda bem que as coisas estão bem diferentes hoje,
não é mesmo?
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