sábado, 7 de julho de 2012

Para entender "o fim do mundo"


Escrevo estas palavras no início de julho de 2012. Segundo disseram, faltam menos de seis meses para o fim do mundo. Já houve até quem vendesse tudo, se preparando para a hecatombe final.
Enquanto isso, seguem usando o termo “apocalipse” para descrever as catástrofes, em especial as mais devastadoras, como se crê que acontecerão antes do Natal. Mas a palavra, ao contrário do que diz o senso comum, não significa “destruição”. A palavra apocalipse, do grego αποκάλυψις, apokálypsis, significa “revelação”, formada por "apo", tirado de, e "kalumna", véu. Um “apocalipse”, na terminologia do judaísmo e do cristianismo, é a revelação divina de coisas (que até então permaneciam secretas) a um profeta escolhido por Deus. Por extensão, passou-se a designar de “apocalipse” aos relatos escritos dessas revelações. Não por acaso, em inglês o nome desse livro é “Revelation”, termo com o qual se inicia: “Revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu para mostrar aos seus servos as coisas que brevemente devem acontecer; e, enviando-as pelo seu anjo, as notificou a seu servo João” (Apocalipse 1:1).
E o que a Bíblia – e em especial, Apocalipse – nos dizem sobre o tal “fim do mundo”?
Muita gente se confunde quando o assunto é “o fim dos tempos”, e costuma-se misturar predições sobre a Igreja com as relacionadas a Israel, em razão de argumentos como “a Igreja é o novo Israel de Deus”, “Israel não aceitou o Messias e por isso suas bênçãos agora foram transferidas para a Igreja”, e similares. Daí decorrem erros grotescos que fazem muitos descrerem das profecias, não quererem estudar o assunto, terem aversão por Apocalipse etc. Mas antes do Apocalipse, existe o sermão profético de Jesus, que lança muita luz sobre o último livro da Bíblia.
As instruções de Jesus aos discípulos sobre o fim dos tempos aparecem em Mateus 24 e 25, Marcos 13 e Lucas 17:20-37. Esses são alguns dos textos mais importantes da Bíblia, porque não apenas nos apresentam o último discurso de Jesus, mas também o Seu ensinamento profético mais extenso. O Sermão Profético revela como Ele interpreta as passagens proféticas do Antigo Testamento a respeito de Israel e das nações. Ele serve como um inspirado esboço dos eventos do fim dos tempos. Além disso, explica o julgamento divino de Israel, especialmente sua restauração prometida no advento do Messias e Seu reino.
Se interpretado adequadamente, o Sermão Profético permite à Igreja dos dias atuais distinguir a si mesma da nação de Israel na Tribulação – o futuro “tempo da angústia de Jacó” – e dos eventos que vão caracterizar esse período anterior ao retorno de Cristo (segunda vida ≠ arrebatamento). Muita confusão vem da falha em entender que o Sermão Profético envolve Israel, e não a Igreja. E refere-se ao tempo futuro, não ao passado – como querem os preteristas, que dizem que tudo já se cumpriu.
Mateus 24:1-14 explica o panorama histórico (v. 1-3) que precipitou o discurso profético e descreve os sinais, ou “dores de parto” (juízos divinos da Tribulação, v. 4-13) e a evangelização global que será proclamada nesse período (v. 14).
A ocasião foi a última jornada a Jerusalém. Os discípulos estavam cientes do pronunciamento de Jesus contra a nação e particularmente contra os escribas e fariseus - Ele tinha acabado de dizer: “Eis que a vossa casa vos ficará deserta” (Mateus 23:38). Assim, eles talvez pensassem que um apelo pela unidade nacional simbolizada pelo Templo poderia amenizar o julgamento da nação. De fato, algumas seitas judaicas, como a dos essênios, esperavam a destruição do Templo, porque ele tinha um sacerdócio corrompido. Os discípulos também estavam impressionados, como muitos daquele tempo, com a magnificência incomparável do Templo, orgulho nacional: “Falavam alguns a respeito do templo, como estava ornado de belas pedras e de dádivas” (Lucas 21:5). Os discípulos viram os últimos acréscimos na estrutura do edifício que, de acordo com João 2:20, tinha sido edificado durante 46 anos: “Mestre! Olha que pedras, e que edifícios!” (Marcos 13:1).
Talvez também pensassem, como Aristéias em sua carta a Filócrates datada de 101 a.C., que o Templo era inviolável e invencível. Por isso, tentavam compreender as afirmações de Jesus sobre o juízo. Em todo caso, Jesus recorreu a ambas as idéias, dizendo que tudo ruiria violentamente no tempo do juízo. É possível que os discípulos pensassem que Jesus se referia à profecia de Zacarias: o Senhor destruiria as nações gentias e estabeleceria o reino messiânico (Zacarias 14:3-9). Eles acreditavam que esses eventos já estavam em andamento e logo viria a revelação pública de Jesus e o Seu reinado como Messias.
Entretanto, enquanto caminhavam com Ele para o Monte das Oliveiras, eles pediram esclarecimento, especialmente em relação ao assunto da destruição do Templo e quando isso ocorreria, com duas perguntas: “Quando sucederão estas coisas, e que sinal haverá quando todas elas estiverem para cumprir-se”. A primeira é sobre a época da destruição do Templo; a segunda (composta de duas partes relacionadas), refere-se aos “sinais” que marcariam a revelação de Jesus como Messias a Israel (no grego, parousia, “presença corporal”). A resposta de Jesus constitui o Sermão Profético, com a primeira questão tratada em Lucas 21:10-24 e a segunda em Mateus 24:4-31 e Marcos 13:1-27.
Há muita discussão se o Sermão Profético já se cumpriu ou não. Alguns dizem que a maioria dos eventos já se cumpriu. Os preteristas afirmam que todos os eventos aconteceram em 70 d.C. Os discípulos também presumiram uma conexão entre a destruição do Templo e o advento do Messias, mas Jesus fez uma descrição detalhada dos eventos para corrigir os mal-entendidos e proteger os discípulos do engano.  Por isso Jesus começa com uma advertência: “Vede que ninguém vos engane” (Marcos 13:5). Deixando de entender essa advertência, os preteristas se perdem, e são obrigados a espiritualizar a profecia para forçar o cumprimento no primeiro século. Mas Jesus explicou que os acontecimentos não ocorreriam todos no mesmo espaço de tempo.
Apesar das terríveis condições da Tribulação, é predito uma grande evangelização a nível mundial: “E será pregado este evangelho do reino por todo o mundo, para testemunho a todas as nações. Então, virá o fim” (Mateus 24:14). Essa mensagem global, mesmo tendo como base a fé em Jesus como Salvador, é o “evangelho do reino”, isto é: diferentemente do evangelho da graça, enfatiza o arrependimento em relação à vinda do Messias para estabelecer o Seu reino messiânico para Israel e sobre as nações. Esse arrependimento é que reverterá a condição de desolação da casa de Israel (Mateus 23:38-39; confira Atos 3:19-21).
Essa foi a mesma mensagem inicialmente pregada por João Batista e por Jesus durante Seu ministério terreno. Entretanto, “o evangelho do reino” não poderá ser proclamado novamente até que Israel retorne aos limites cronológicos da 70ª semana de Daniel. É isso que muitos – inclusive pastores – não entendem e confundem tudo. Já ouvi pastores dizendo, em tom de ameaça a suas congregações, que só quem perseverar até o fim é que será salvo (Mateus 10:22 e 24:13, e também Marcos 13:13). Confundem a atual era da graça, da Igreja, com a Tribulação; o evangelho da graça e o evangelho do Reino; a salvação pela graça e a salvação pelas obras. Ora, se a minha salvação depende da minha perseverança, logo já não é pela graça, mas pela minha obra de perseverança. Portanto, como vivemos na era da graça, essa afirmação não diz respeito à Igreja. O termo grego para “mundo” em Mateus 24:14 inclui, de fato, os gentios, mas temos que lembrar que nesse tempo a Igreja não estará mais sobre a Terra, pois já terá sido arrebatada, doa a quem doer.
É o “mundo” que Cristo virá julgar (Atos 17:31), implícito na frase “Então virá o fim” (Mateus 24:14). Essa evangelização global não ocorreu entre 25 ou 30 anos após a ascensão de Cristo, e nem a Grande Comissão foi cumprida até 70 d.C., como afirmam os preteristas.
É importante notar também que “então virá o fim” está no contexto da Tribulação, quando a Igreja não mais estará sobre a face da Terra – daí que a tarefa dessa evangelização mundial, quando “será pregado este evangelho do reino por todo o mundo”, será levada a cabo não pelos crentes de hoje, mas pelos santos da Tribulação e pelos anjos. Não faz sentido “pregar o evangelho para apressar a vinda de Jesus... e então virá o fim”. Devemos pregar hoje para salvar alguns, “arrebatando-os do fogo” (Judas 23), justamente para que possam escapar da Tribulação!
Depois disso, isto é, o arrebatamento da Igreja, os julgamentos da Tribulação vão cumprir a promessa da profecia entregue a Jeremias, de que Israel “será livre dela” (Jeremias 30:7).
Não sei se faltam mesmo seis meses para a tribulação pela qual o mundo e as nações hão de passar. Jesus Cristo não nos autorizou a fazer adivinhações e cálculos para descobrir o dia e a hora com precisão. Pelo contrário, Ele disse que “daquele dia e hora, porém, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, senão só o Pai” (Mateus 24:36). Podem faltar seis meses, seis anos ou seis minutos.
O que nos cabe é estar alertas e preparados, pois “bem aventurado é aquele servo a quem o seu senhor, quando vier, achar assim fazendo [vigiando constantemente] (Mateus 24:46).

Baseado em artigo de Randall Price, escritor, arqueólogo e presidente de World of the Bible Ministries, publicado anteriormente na revista Chamada da Meia-Noite, setembro de 2008.

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