
O resultado todos sabem. Cinco dias depois de zarpar, o colosso de 46.000 toneladas jazia a 3.800 metros de profundidade no Atlântico Norte, arrastando consigo mais de 1.500 pessoas, dois terços dos passageiros, tornando o empreendimento, em poucas horas, uma das maiores catástrofes de todos os tempos. Apenas 706 sobreviveram para contar a história, inclusive o próprio Ismay, que acabou morrendo 25 anos depois, de causas naturais.
Há quem veja nesse episódio “o peso da mão de Deus”, que não teria tolerado a ofensa. Outros acham que Deus não se importaria com boquirrotos do naipe de J. B. Ismay, pois não admitem que Deus tenha matado tantas pessoas apenas para se vingar de um único empresário arrogante. Nem se sabe ao certo se ele disse mesmo a tal frase, alegam.

A primeira, é mesmo sobre a arrogância do ser humano. Desde que o Homem pecou, lá no jardim do Éden, ele foi contaminado com o vírus da auto-suficiência; ou melhor, a ilusão da auto-suficiência. Esse vírus lhe foi inoculado por aquele que foi a primeira vítima, Satanás, que então se chamava Lúcifer. Diz a Bíblia que esse anjo era, por assim dizer, a “obra-prima” da criação (confira em Isaías 14:12-20).
Tudo isso acabou lhe subindo à cabeça, e Lúcifer pensou que era o cara; cheio de si, imaginou derrubar o próprio Deus de Seu trono e assumir Seu lugar. Para isso, chegou a arregimentar uma multidão de seguidores que chegou a um terço de todos os outros anjos (Apocalipse 12:4). Mas, na sua arrogância, se deu mal, e acabou expulso dos lugares celestiais. Desde então, busca frustrar os planos de Deus.
O primeiro alvo foi o primeiro casal de humanos. E o tentador foi bem sucedido, pois ele conseguiu convencer – primeiro Eva, depois Adão – de que eles não precisavam de Deus e podiam se dar muito bem sozinhos, sem a tutela do Criador.
O Diabo colocou na cabeça de Eva a dúvida sobre Deus, dizendo que “não era bem assim” o que o Criador havia dito (Genesis3:4,5), e que os humanos podiam ser independentes – ou seja, plantou em suas cabeças a semente da arrogância.
Pouco tempo depois a coisa cresceu tanto que o gênero humano logo já desprezava completamente as ordenanças divinas. O homem decidiu que não iria mais fazer sacrifícios propiciatórios, nada disso; pelo contrário, ele mesmo iria construir para si um meio de chegar até os céus, por seus próprios méritos. Para isso, juntou uma patota e começou a construir uma torre, “cujo topo chegue até os céus” (Genesis 11:1-9).
Também sabemos em que deu essa iniciativa – uma pilha de tijolos abandonados em algum lugar da Mesopotâmia. E outros exemplos de arrogância podem ser vistos aqui. O Titanic é apenas mais um nessa longa lista de fracassos, que o Homem insiste em ignorar. De alguma forma, ele ainda acha que um dia será capaz de se virar sozinho.
A segunda lição que tiramos diz respeito à Igreja. Certa vez ouvi um pregador dizer que a Igreja deve ser como o navio. Ela precisa estar no mar, entrar no mar, mas o mar não pode entrar nela. Se isso acontecer e nada for feito para tirar o mar do navio, é o fim.
Cem anos atrás, alguma coisa aconteceu que os pilotos, o capitão, a tripulação, sei lá, alguém, comeu uma mosca do tamanho de um iceberg, e quando deram por si, o mar já invadira o navio de forma inexorável. Não havia mais o que fazer, a não ser abandonar o barco. Todo mundo conhece a historia, mesmo que só a associe à imagem do Leonardo DiCaprio.
O fato é que o nosso navio, a Igreja, começou a fazer água, perder velocidade, quando deixou que o mar entrasse. Na Bíblia, o mar é símbolo das nações, e por extensão, do poder humano, resistente ao senhorio de Deus. Para entender melhor, leia o Salmo 2 e logo depois Apocalipse 13. Os nossos tripulantes do terceiro século acharam que um pouco da água do mar não faria mal nenhum. E aí a situação desgringolou tanto que o navio se perdeu totalmente, e vagou às cegas por mil anos. Só recuperou um pouco do rumo quando alguns tiveram a visão de jogar a água fora e reparar o casco.
Foi suficiente?
Talvez, por um tempo, mas não nos esqueçamos de que o primeiro portador do vírus da arrogância – lembra? – é também o espalhador de icebergs na rota do navio. Ele não é besta, e às vezes – quase sempre – o iceberg está invisível. Ou então, como no caso recente do navio Costa Concórdia, o tentador se esforça para desviar o navio, levando-o em direção a rochas submersas, que não aparecem no radar! Ele tenta distrair o pessoal de bordo, para que pensem que estão num cruzeiro de férias e diversão, e não em missão de guerra, e de salvamento e resgate. Esse é o papel da Igreja: pregar o Evangelho aos perdidos, resgatá-los das mãos do Diabo, e resistir ao inimigo; a Igreja não é um ambiente de lazer!
- Supõe-se que se a colisão com o iceberg tivesse sido de frente, apenas um compartimento ou dois seriam danificados, o fecho das comportas automáticas solucionaria o problema, e a viagem seguiria normalmente.
- Também se supõe que, caso o iceberg tivesse sido visto meio minuto antes, a colisão teria sido evitada.

- Os vigias noturnos deveriam ter binóculos, pois já se sabia que iriam passar numa zona de icebergs. Porém o material não foi fornecido a tempo, e os vigias tiveram de trabalhar sem auxílio visual. Com os binóculos, os procedimentos de emergência poderiam ter sido efetuados muito antes, pois o iceberg teria sido visto de longe.
Não é preciso esticar mais o assunto, pois as analogias são bem claras.
A Igreja hoje navega em águas perigosas. Circulamos despreocupadamente em torno de icebergs ameaçadores, e pedaços deles, cada vez maiores, caem em nosso convés a todo instante. Ensinos heréticos – como o de que Jesus teria sido criado – são aceitos por muitos como coisa normal; a teologia do domínio e a da prosperidade tomam o lugar das pregações sobre a salvação, sobre santificação, sobre a volta iminente do Senhor. E não nos importamos; pelo contrário, damos crédito aos arautos de heresias.


120830
In Memorian do meu amigo Sergio Barbosa Toledo