
Curioso no quadro é que foram excluídos outros personagens originais da história, como os indígenas. E aí é que começam meus questionamentos.
A história – ou melhor, uma versão dela – diz, em resumo, que os peregrinos recém-chegados à América no navio Mayflower em 1620, fugidos da perseguição religiosa na Europa e desejosos de estabelecer uma nova vida, guiados por ideais cristãos, passaram terríveis dificuldades e por fim fizeram amizade com indígenas, que os ensinaram a cultivar o milho, plantar abóboras, capturar perus e assim sobreviver. Foi então celebrada a paz e todos viveram felizes para sempre.


Ao longo do tempo, esses episódios sangrentos foram sendo apagados da história, por razões óbvias, ao ponto de, na obra que ilustra este artigo, não haver, como citei, nenhum índio... Aliás, a decantada "terra das oportunidades" é até hoje um cenário de bang-bang, um salve-se quem puder. E geralmente salva-se quem tem a arma de maior calibre.
A república se fez sob as luzes do humanismo, e não de “valores cristãos” como se quer fazer crer. Os homens que redigiram a carta magna não eram assim tão evangélicos: eram no máximo “deístas”. Tinham uma noção de que havia um Criador, que depois deixara tudo “ao Deus dará”, ao acaso. Essa era a corrente dominante na época, que ecoa até aos sermões de Harry Emerson Fosdick e Ralph Waldo Emerson. Se o cristianismo lá fosse para valer, a escravidão não teria durado mais um século; os índios não seriam desalojados à força de seus territórios e confinados a reservas distantes, em cuja mudança a maioria morria e era largada à beira do caminho.
As universidades de Yale, Harvard e Cambridge teriam permanecido fiéis aos princípios originais cristãos, e não teriam se transformado no caldo de cultura para organizações como a Maçonaria, Caveira e Ossos e até a KKK.

Se o cristianismo fosse para valer, os americanos não teriam se tornado arrogantes e indesejados pelo resto do planeta, ao manterem sua filosofia predatória e destruidora que causa uma guerra atrás da outra. Não teriam criado, a exemplo de Hitler, campos de concentração durante a II Guerra, para “inimigos em potencial” (no caso, para quem não sabe, japoneses e seus descendentes então em solo americano foram confinados a campos nos desertos).
Basta ver que se apossaram de metade do México, roubaram a Louisiana da França, tomaram as Filipinas da Espanha, fizeram de Cuba um bordel a céu aberto. Promoveram golpes de estado por toda parte ao sul do Rio Bravo; meteram o bedelho no Vietnam e na Coréia, impõem um bloqueio desumano e cruel a uma nação pequena e que não tem nem força aérea, sob a justificativa esfarrapada da "ameaça vermelha". Deram com os burros n’água, ou melhor, na areia, ao financiar os talibãs contra os russos e Saddam Hussein contra o Irã, e agora lidam mal e porcamente com as conseqüências.

E depois não entendem – ou fingem que não entendem – por que o mundo os odeia. Talvez por isso Hugo Chávez, o notório boquirroto bolivariano, que não perdia uma oportunidade, tenha dado a Barack Obama um exemplar do livro “As Veias Abertas da América Latina”, do jornalista uruguaio Eduardo Galeano, onde se narram as atrocidades, a maioria de pedigree yankee, perpetradas contra nossa gente. Que também é americana, embora separada da “terra dos bravos” por um muro que se iguala em ignomínia àquele outro, de Berlim, de finalidade ideológica. O de Washington é racista mesmo, doa a quem doer. Em tempo: Obama, com toda sua a pinta de intelectual, nunca havia havido falar nem do livro nem do autor, assim como a maioria de seus súditos, inclusive pessoal de embaixadas por aqui, que me disseram isto com todas as letras.
Se os fundadores da nação levassem o cristianismo a sério, a inscrição “In God We Trust” nas notas de dólar não estaria acompanhada de símbolos ocultistas, como pirâmides e o “olho que tudo vê”, e nem a planta da capital seria um mapa esotérico com os pontos chave inseridos num pentagrama colossal. Podia ficar aqui uma semana listando essas coisas, mas o espaço é curto.


Assim, façamos sim uma ação de graças. Não em um feriado importado, como um Halloween ou coisa que o valha, pois o Dia de Ação de Graças hoje é uma data comercial tanto quanto o Natal, desde 1939, quando Roosevelt instituiu a celebração oficialmente para o comércio, aumentando o tempo disponível para propagandas e compras antes do fim do ano (pois era considerado inapropriado fazer publicidade antes do Dia de Ação de Graças). Rejeitemos costumes que começaram aparentemente bem, mas se tornaram apenas comércio e imperialismo cultural. Respeitamos e honramos a dívida que temos para com os servos de Deus que de lá vieram, mas rejeitamos os enganos que também vêm daquele país.
Que o verdadeiro cristão faça de todo dia e cada dia um dia de ação de graças, pois, como diz a Escritura, “Este é o dia que o Senhor fez; regozijemo-nos, e alegremo-nos nele” (Salmo 118:24). E que venha a data em que vejamos, dividindo o gordo peru, não apenas red-necks rubicundos, mas também negros, indígenas, hispânicos e todos os outros que, ao lado dos euro-descendentes ajudaram a construir a terra das oportunidades, só para dela serem excluídos mais tarde.
Em tempo - Será que o Obama já leu o livro que o Chaves deu para ele? (Link aqui)